Diva em Casa(s)

Nesta pandemia que já virou um pandemónio, e sem tocar na parte sensível da coisa porque não é para isso que serve o meu blog (apesar de estar naturalmente sensível ao tema e de zelar pelo bem) muitas coisas mudaram. Principalmente aquelas que se referem à esfera social. Agora que quase praticamente não temos restaurantes, bares, discotecas, qualquer lanche em casa se transforma numa matiné, um simples jantar num after, o pequeno almoço no único encontro ao ar livre possível ao fim de semana.

Os Djs que antes, e felizmente, pagávamos para ir ver foram substituídos por aquele amigo que não larga o computador e não deixa uma música terminar porque a meio se lembrou de uma muito melhor e, surpresa, a meio da seguinte, uma melhor ainda. Já não conseguimos definir um género de festa porque nestas noites não há lugar para géneros nem preconceitos musicais. O outrora gótico lança uns Sisters of Mercy que muito rapidamente são substituídos por uma La Isla Bonita ou uns Roxette que culminam num set techno pseudo espiritual gravado num lago algures, quando ainda não se apanhava o bicho nos festivais. É no centro desta esquizofrenia caseira que a magia acontece. O tapete da sala transforma-se numa pista de dança, a cozinha no Bar, só não vamos ao WC a duas porque na festa somos só 3 ou 4 e parece que estamos a criar grupinhos à parte. Também não convém sair à francesa porque nem calçados estamos, o que torna o processo de abandono mais evidente.

Aqueles kits giros que antes comprávamos especialmente para sair à noite foram substituídos por roupa de casa que se quer fazer passar por roupa de rua, como naqueles Carnavais em que até me queria mascarar mas já não fui a tempo de preparar o personagem e desenrasquei um Hippie ou um amante dos anos 80, ambos tão pobres, que nunca ninguém se deu ao trabalho de perguntar qual era a minha ideia. Aquelas leggins rotas em lugares que até a mim me custa descobrir, as meias longas que aconchegam os tornozelos, criam uma espécie de tendência quando se associam a uma simples camisola de lã que, de repente, dignifica o look, cumprindo a mísera expetativa de estar apresentável pelo menos para aqueles amigos que já nos viram fazer xixi na rua. Estamos a entrar na era dos mínimos, meus queridos.

Como nem tudo tem um lado miserável, é curioso constatar que a personalidade de cada uma das nossas casas de repente renasceu e encarnou a nossa persona noturna. Na minha respira-se um ambiente razoável para um singelo copo até às 3h. O meu candeeiro regulável, deveras desafiante e nervoso, traz consigo uma iluminação quente e ténue enquanto que as cores eleitas para o meu decor girly, rosa velho e bordô, nos remetem para um bar que podia muito bem chamar-se Lolita. Já outras, aquelas que abrigam os amigos mais atrevidos, ganharam uma aura underground e psicadélica, vestida por velas, perfeita para ser vivida até mais tarde, sempre com música de sussurro para não afetar a vizinhança mais sensível.

Estes novos clubes, cuja guest list previsível tem 3 linhas, também devem estar bem munidos de Bar. Já adultos é que percebemos que fica bem ter uma bebida ou outra em casa para servir a um amigo em apuros, que não seja o licor de chocolate que a mãe ofereceu no Natal. Como chez nous o Bar é naturalmente mais reduzido, acabamos por ser mais criativos e a beber o que houver, com o que tivermos, mesmo sem gelo para acompanhar. Nas Ladies Night também emborcava rum cola quando as histéricas já tinham bebido a vodka toda e não morri. Também devem ser espaços Iqos friendly porque o ar mantém-se fresco e, já que estamos praticamente de pijama, é simpático podermos fumar no quadrado onde estamos a dançar sem ter que ir de focinho à janela. Ainda sobre o tapete, que vira pista de dança, é fundamental que seja fofo, escuro, abafe ligeiramente o som e não tenha as suas pontas reviradas para calcar, que trabalheira.

Nestas pequenas festas também consta por vezes um momento de styling dado que, sem nada para fazer e presos entre quatro paredes, fica fácil encarar um figurino, enfrentar um acessório simples na cabeça, que porventura o dono da casa deixou perdido, um lenço de Viana que está claramente subestimado em cima de uma cadeira e que compõe bastante uma pessoa, principalmente quando a este se juntam uns simples óculos de fraca graduação que foram deixados na mesa do teletrabalho.

Devo também referir que em casa em tempos de Covid ninguém entra calçado portanto sem pantufas 40 para os amigos, nada feito.

Love,

D.

Leave a Reply

Your email address will not be published. Required fields are marked *