Diva troca LIS-BON pelo Ouriço.

No fim de semana passado recebi um convite para o LIS-BON – Jardim Sonoro, festival de música de dança que acontece no Parque Eduardo Sétimo.

É um evento engraçado que se prolonga durante a tarde e que normalmente se esgota com os “Fusers”, “Bloopers” e “Brunchers” deste país. Neste caldeirão eletrónico juntam-se também alguns cromos da publicidade e magníficas figuras públicas, daquelas a quem eu às vezes digo “olá” por achar que as conheço do “café”.

O Jardim Sonoro está entre as festas favoritas dos ravers contemporâneos, esses seres mágicos, urbanos, mestres dos filtros Instagram, detentores dos fantásticos óculos de Sol da Moov Shop, com vidas sociais ativas, incrivelmente sedutoras e bem sucedidas. 

Estarei iludida? Creio que não.

O que é certo é que troquei tudo isto (e reparem que não foi pouco) por uma noite na Ericeira. Esta é que é a verdade.

Mas passo a explicar.

Tratava-se do aniversário de uma amiga, nativa da região com o micro-clima mais peculiar da estremadura, que resolveu fazer uma festinha regada com vinho verde, comidas saborosas e uma piscina onde as ressacas se curam com banhos de glamour. Uma festa que começou à tarde e que continuou pela noite dentro, não estivessem os convidados mortinhos por um pezinho de dança.

A Ericeira tem graça. Os bares são sui generis, com pinta e passam sonoridades entre o hip-hop e os 80´s. As ruas do centro noturno enchem-se de turistas, gente da terra e alguma miudagem. A maior parte são surfistas, essa raça geralmente bem-apessoada e bronzeada cujo género literário favorito é o Wind Guru, o filme de culto está na seleção do Beachcam  e o lema de vida, o profundo slogan “Destrói as Ondas não as Praias”. Quase me afogo com tamanha profundidade.

Já com o roteiro dos bares feito, algumas capirinhas e capiroskas no bucho, fomos direitos ao ex libris da Ericeira:

O Ouriço. 

A discoteca mais antiga da Península Ibérica.

Com 55 anos de existência, este espaço conta com um pé direito inferior ao da minha casa e com uma ventilação digna de uma ventoinha de bolso.

Assim que entrámos neste Club, (adoro este termo, acho super New York) um calor insuportável, misturado com cacimba humana, levava o nosso organismo ligeiramente alcoolizado para perto de um coma profundo. Sobre a música, era tão boa que preferia ouvir a estação de rádio de Oliveira de Azeméis até à eternidade. Porém, como o espaço é mítico e o grupo estava divertido, resolvi dar uma oportunidade e muito rapidamente já dançava e cantava emocionada, fingindo que sabia os lyrics. Estranha forma de integração esta de palrar músicas que mal conhecemos, não é? Atire a primeira pedra quem nunca o fez.

A dada altura, não indiferente ao cansaço, já revirava os olhos dando sinais de que estava a entrar nas últimas. Um amigo, daqueles para quem a noite ainda agora começara, percebeu o meu estado de derrota e, por considerar que podia ser um elemento dissuasor contra a festa, resolveu gritar na minha direção:

– “DIVA, TENS QUE TER PACIÊNCIA!”  

ou seja:

“Aguenta-te pois vais ter que papar mais 10 espanholadas, 5 hits do top Orbital, 3 cromos a pedirem-te cigarros em troca de perdigotos e… sabe Deus.”

Apesar de cansada, acabei por me converter ao espírito do grupo e dirigi-me ao WC para ganhar forças e regressar à Pista de Verano. 

Mal integro a fila das meninas aflitas, percebo que estou ao lado de uma Diva, a quem o Sol já queimou algumas camadas valentes da pele, claramente com os copos mas com uma atitude digna de vedeta da TV 7 Dias. Aparentemente cliente da casa, trazia uma espécie de rabo de cavalo de lado, um vestido curto preto e umas pratas que lhe envolviam o pescoço. Com as suas costas exercia pressão para fechar a porta do WC, não permitindo que a confusão se gerasse ali dentro, ao mesmo tempo que alçava uma perna sobre o lavatório, com a naturalidade de quem pousa um cotovelo na mesa durante a sobremesa.

Instintivamente percebi que estava perante a Rainha da Ericeira.

Em 3 tempos meteu conversa comigo e tentou apurar o que fazia da vida. Antes de lhe responder, fui atropelada por uma amiga que, com ar confiante e determinado, lhe disse na minha vez:

– Ela tem um BLOG! – Confesso que me deixou lisonjeada.

Senti-me obrigada a dizer que essa não era exatamente a minha profissão e, sem lhe dar grande atenção, fui colaborando com o seu inquérito das 5h da manhã. Apesar de ter apreciado o nome do meu ninho virtual, assumiu que nunca tinha lido nada meu, nem tinha ouvido falar em tal coisa.

Enquanto ela continuava a falar na minha direção, eu só tinha olhos para aquela perna alçada. Estava a deixar-me desconfortável e, portanto, pouco receptiva a esta amizade com a Nobreza do Oeste.

Não contente com a minha postura, aparentemente indiferente, começou a jogar alto para captar a atenção daquela que suspeitava ser a blogger do ano:

Rainha da Ericeira: Sabes que o sítio onde trabalho representa 4 blogs…? É uma empresa daquelas pequenas, que ninguém conhece…  Está no retalho e na distribuição… Só tem 36 lojas e representa 11 marcas, imagina… – e foi a primeira vez que a ironia me soou pior que uma cena de product placement da TVI.

Diva: Ah isso é ótimo. Mas de quê? – disse eu ao mesmo tempo que a minha amiga, defensora do meu talento e vocação, continuava a responder por mim:

Amiga defensora da Diva: “Ahh ela é muito independente!” – Como quem diz, “Ela não precisa dessas coisas…” (Eu? Nunca. Aliás, não tenho mãos a medir com os patrocínios que me chegam).

Rainha da Ericeira: É uma empresa pequena, com marcas desconhecidas…  De certeza que não conheces.- E assim continuava a Rainha da Ericeira, num loop irónico e tonto, sempre de perna alçada e cara de whiskey.

Diva: Pois sim, claro. Mas marcas de quê…?! – Respondia eu já sem paciência mas com alguma curiosidade.

Rainha da Ericeira: Essa é que é essa, não é…? – Oh Deus. Não tinha bebido o suficiente para isto, pensei. Ela estava mesmo picada. Provavelmente pensou que me estava a armar em Pipoca Salgada quando eu só queria fazer xixi.

A muito custo, e não querendo revelar o segredo desta querida, só vos posso dizer que acabou por afirmar que trabalha naquela marca de luxo do surf com um nome começado por “Ericeira”. Depois da revelação do misterioso graal, continuou a perseguir-me com tanta agressividade que tive que abandonar o barco para não levar uma pranchada. Não ando à porrada desde o 5º ano, senti que podia correr mal.

Despedi-me dela cordialmente e voltei para a pista onde estavam os meus amigos, ainda em êxtase, como se tivessem sido pagos pela CM da Ericeira para animar a malta.

Ainda pairava na minha cabeça o momento surreal pelo qual tinha passado. Teria eu acabado de desperdiçar o patrocínio da minha vida?

Logo eu, uma surfista em ascensão e fã incondicional dos trapos da Semente e da Billabong

Love,

D.

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