Diva e o timing no Pingo Doce.

Há dias percebi que é nos lugares mais inusitados que conseguimos captar a essência das pessoas, perceber aquilo que entregam ao mundo enquanto seres humanos, chegar ao seu lado mais bondoso, assim como tocar na sua esfera mais perversa e maliciosa.

Foi precisamente na caixa do Pingo Doce que uma força superior me iluminou sobre um dos segredos da Humanidade. Cheguei à conclusão que o timing é um dos elementos que mais interfere na boa gestão das relações interpessoais. Sei que parece básico mas é de génio, acreditem.

Depois deste meu approach quase freudiano, peço-vos que leiam o exemplo que sustenta a minha tese:

Caixa do Pingo Doce às 10h30:

Dados relevantes: 

Público: Desempregados, donas de casa com mais de 60 anos, gente que vai às compras de manhã.

Estado emocional da senhora da caixa: Relaxada, acabadinha de enfardar um pastel de nata quentinho, feliz por ter pouca gente na fila, o que a possibilita ir dando uma vista de olhos na Maria enquanto trabalha.

Contexto da Diva: Na fila da caixa, apenas com um  Iced Tea, algodões para a cara e papel higiénico.

Diálogo:

Senhora da Caixa: Bom dia! O senhor não se importa de deixar passar essa jovem aí atrás que só traz umas coisinhas?

Diva: Ai, muito obrigada, não é preciso… deixe lá!

Senhor à minha frente na fila com um carro cheio: Ai por amor de Deus, era o que mais faltava, por favor passe minha querida!

Entretanto, já à frente, ouço uma senhora no final da fila…

Senhora com permanente típica dos anos 90 – Opah, esqueci-me de trazer as bolachas sem glúten para o meu Zé? Importam-se que vá lá num instante?- e remata levando as mãos à cabeça…

Toda a fila em coro: Claro que não, vá por favor!

Conclusão: Suspeito que deve ser permitido roubar no Pingo Doce às 10h30 sem quaisquer sanções. Pelo menos até uma despesa de 20€.

Em contrapartida: 

Caixa do Pingo Doce às 20h: 

Dados relevantes: 

Público: Pessoal vindo do trabalho morto de fome, mães que acabaram de ir buscar os putos ao colégio mas que já nem os podem ver, pessoal com os copos.

Estado emocional da senhora da caixa: Cansada, a contar os minutos para dar de frosques, faminta, já discutiu duas vezes com a gerente de loja e pelo menos uma com o segurança.

Contexto da Diva: Com ar esgotado na fila de 5 metros, preparada para pagar uns canelones congelados, uma garrafa de vinho baratucha e um kinder bueno. 

Diálogo: 

Diva: Será que não me podia deixar passar à frente, só tenho estas coisas… – Digo sorridente à mãe de ar afável que estava à minha frente.

Mãe aparentemente afável:  Desculpe, mas não. A não ser que esteja grávida… Está, por acaso? – e dá um tabefe ao filho que, ao ver o meu kinder bueno, não parava de gritar por também querer um.

Diva: Não, mas preciso? O que é feito da boa vontade? Do civismo? Da amabilidade entre estranhos?

Senhora da Caixa: Era só o que faltava! Se não está grávida tem mais é que esperar. Deve pensar que é uma Diva, não?

Diva: Por acaso até sou.

Toda a Fila em coro: Olha a Diva…!

Miúda com 18 anos com uma garrafa de vodka na mão: Eu estou grávida!!!

Conclusão: Deixei as merdas em cima do tapete rolante só para estorvar e resolvi passar por lá na manhã seguinte.

Cansativos.

Love,

D.

3 Comments Add yours

  1. Andrea says:

    Se fores ao Pão de Açucar é mai fino!

  2. joana says:

    Eu vou sempre por volta das 19h e levo sempre com velhos chatos na fila. Não percebo por que é que não vão durante o dia. Parece que é mesmo só para chatear quem trabalha…

    1. Cara Rita, ninguém percebe. Temos que ser fortes.

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